Resonancias vol. 21, n° 40, enero-junio 2017, pp. 71-100.
DOI: https://doi.org/10.7764/res.2017.40.5
A lo largo del siglo XX no fueron raras las organizaciones musicales que respondieron a las siguientes características: estarán dirigidas por compositores, se dedicarán a la producción y programación de conciertos preinterpretados por obras inéditas y tendrán una dimensión local. Entre 1942 y 1960, Lisboa contó con una organización con las características mencionadas anteriormente: la Sociedad Sonata, fundada por el compositor Fernando Lopes-Graça (1906-1994), figura fundamental en la historia de la música clásica en Portugal. La relevancia de la Sonata tiene, en efecto, mucho que ver con la importancia que tiene Lopes-Graça para la historia cultural portuguesa, pero está particularmente ligada a la actividad que desarrolló durante dos décadas. En este artículo me centraré en primer lugar en el papel que tiene Lopes-Graça en la definición de las líneas programáticas de la Sonata y, en particular, en el modo en que ciertas ideas sobre lo moderno en la música, desarrolladas por Lopes-Graça en su obra periodística colaboraciones, se reflejarán en la orientación que se le dé a esta organización musical. Center-me-ei tiene otro aspecto más. Me refiero al esfuerzo realizado para establecer vínculos internacionales. Estudio en particular el paso de la Sonata a la Sociedad Internacional de Música Contemporánea (SIMC). Lo utilizo como principal fuente primaria o archivo administrativo de la sociedad, conservado en la Academia dos Amantes da Música, en Lisboa. Adjunto, el artículo presenta una lista del repertorio completo interpretado en los conciertos de Sonata en Lisboa.
Durante o século XX, não foram infrequentes as organizações musicais que respondiam às seguintes características: estarem dirigidas por compositores, dedicarem-se à produção e programação de concertos preenchidos por novas obras e terem uma dimensão local. Trata-se de um fenómeno internacional, ao qual tem sido prestada a devida atenção no âmbito da musicologia (vejam-se, entre outros muitos, Szmolyan 1981, Aguila 1992, Ulm 1995, Donin 2001, Kildea 2002). Entre 1942 e 1960, Lisboa contou com uma organização que apresentava as características mencionadas: a sociedade Sonata, fundada pelo compositor Fernando Lopes-Graça (1906-1994), uma figura fundamental para a história da música erudita em Portugal. A relevância da Sonata tem, de facto, muito a ver com a importância que Lopes-Graça tem para a história cultural portuguesa, porém, deriva-se sobretudo da actividade que desenvolveu, em condições permanentemente precárias, entre 1942 e 1960. Nesses anos, Sonata programou um total de 85 concertos, nos quais apresentou cerca de 450 peças, da autoria de 126 compositores, sendo mais de um terço delas em estreia portuguesa (veja-se Apéndice).
O interesse pelo estudo da programação musical como objecto da pesquisa musicológica tem aumentado nos últimos anos, nomeadamente a partir dos trabalhos de William Weber. O historiador californiano inicia um dos seus livros mais importantes sobre o tema com as seguintes frases, que constituem um dos pontos de partida do presente artigo:
Criar um programa de concerto envolve um conjunto de compromissos entre públicos, músicos, gostos e, por extensão, forças sociais. Sendo que a maior parte dos concertos serve uma variedade de grupos, de gostos, de desejos e de necessidades diferentes, planificar um programa é uma espécie de processo político (Weber 2008, 1).[1]
A programação da Sonata, definida fundamentalmente por Lopes-Graça, ao mesmo tempo que condicionada pelos meios com que contava e pelo meio onde funcionou, pode ser interpretada nestes termos. Para valorar a sua trascendência, cabe aludir ao papel que a imagem construída da história da música como reflexo do progresso cultural nacional tem em termos simbólicos e ideológicos, sobretudo no que se refere à representação, para consumo interior e exterior, da nação, portuguesa neste caso, contemporânea. Trata-se de um problema já estudado (Vargas 2011) e que, na realidade, afecta a muitos países ocidentais, incluindo os europeus. Isto é, o significado da programação musical pode ser interpretada a partir de diversos pontos de vista, um dos quais é o do seu papel em discursos de progresso e de emancipação nacional. A programação musical, portanto, também pode representar (Chartier 1988) valores que, como assinala Weber, são inseparáveis da relação entre os agentes envolvidos e lhe conferem uma dimensão política no sentido mais amplo do termo.
Neste artigo, debruçar-me-ei em primeiro lugar sobre o papel que o compositor português Fernando Lopes-Graça teve na definição das linhas programáticas da Sonata. Complementa um artigo anterior, em que foi estudado o seu modo de funcionamento (Cascudo 2016). Em particular, estudo neste texto a forma como determinadas ideias sobre o moderno em música, desenvolvidas por Lopes-Graça em colaborações jornalísticas, se plasmaram na orientação dada à organização musical. Centrar-me-ei ainda numa segunda faceta. Refiro-me ao esforço desenvolvido por estabelecer vínculos internacionais. Traço, portanto, uma parte da história da Sonata focada nos aspectos organizativos que se relacionam com a sua concepção como instrumento de apertura e de actualização da vida musical lisboeta. Estudo em particular a passagem da Sonata pela Sociedade Internacional de Música Contemporânea (SIMC). Utilizo com fonte primaria principal o arquivo administrativo da sociedade, conservado na Academia de Amadores de Música, em Lisboa, uma organização privada dedicada sobretudo ao ensino da música com a qual Lopes-Graça colaborou de forma regular durante décadas.[2]
O fundamento da estratégia perseguida por Lopes-Graça com a fundação da Sonata encontra-se num dos seus ensaios mais importantes, a Introdução à música moderna, publicado na Biblioteca Cosmos em 1942 e reeditado em 1946 (Cascudo 2003). Nesse texto, cuja origem está numa conferência apresentada na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1941 e logo divulgada nas páginas da revista Seara Nova, faz depender explicitamente a divulgação das novidades no âmbito da composição musical da educação do público, entendida aqui como uma suspensão dos preconceitos que ditam o que é aceitável ou inaceitável em música, necessariamente acompanhada por um esforço de assimilação da nova linguagem musical. Lopes-Graça denuncia no mesmo ensaio a relação, por assim dizer, pervertida pelo capitalismo dos agentes participantes na prática musical contemporânea, empresários, intérpretes e público:
O empresário é que é soberano, e os seus interesses estão acima dos interesses da arte. O intérprete é o assalariado, e a sua vontade tem que se conformar à vontade do empresário. O público é o consumidor, e é evidente que só pode consumir aquilo que o empresário, através do intérprete, lhe manda servir (Lopes-Graça 1942, 112).
Deste circuito, basicamente comercial segundo Lopes-Graça, ficavam por princípio excluídas as considerações de ordem cultural ou educativa. Desse ponto de vista, Sonata foi, portanto, concebida como um espaço alternativo e sem fins lucrativos. O manifesto fundacional, reproduzido no primeiro programa em Dezembro de 1942, vinculava este acto de resistência às imposições do mercado com a defesa da música moderna:
Uma cultura, qualquer espécie de cultura, é incompleta, viciada, unilateral se só olha para o passado e recusa o presente, naquilo que este tem ou possa ter de vivo, de criador, de fecundo, se não acompanha o presente no seu caminho de descoberta e de conquista para o futuro. A música de hoje, a música do nosso tempo, a chamada, com boas e más intenções, “música moderna” é uma das realidades vivas do presente.[3]
Duas matrizes ideológicas principais conformaram o projecto da Sonata. Em primeiro lugar, e como já foi explicado em trabalhos anteriores (Cascudo 1996), Lopes-Graça prezou o exemplo dos músicos do liberalismo português que trabalharam pela “modernização” da vida musical lisboeta, começando por João Domingos Bomtempo e terminando em seu mestre, José Viana da Mota. No fundo, o que estava em causa era a dupla preocupação, pessoalmente partilhada com ambos compositores oitocentistas, com a “europeização da cultura musical e a criação de uma música nacional” (Lopes-Graça [1934] 1989, 84). Esta era uma posição que Lopes-Graça tinha anunciado em textos anteriores, nomeadamente em dois artigos publicados na revista Seara Nova em 1931. No primeiro, “Estado actual da cultura musical em Portugal”, declara: “Porque o nosso Renascimento, o nosso verdadeiro Nacionalismo, deve começar por aqui: pela nossa reintegração na civilização europeia” (Lopes-Graça [1931a] 1989, 92). E no segundo, “Tradição e inovação”, onde afirma que o melhor para a música portuguesa era fazer tábua rasa de todo o “passado de rotina, de insignificancia, de atraso, quando não de imbecilidade” (Lopes-Graça [1931b] 1989, 171), esboça a tese posteriormente exposta na dissertação sobre a música do século XIX, com argumentos históricos centrados no papel fundamental do liberalismo na promoção da música portuguesa.
Estes artigos visavam uma espécie de reconstrução em Portugal de uma tradição musical liberal-republicana, que levou, por exemplo, Lopes-Graça a ignorar a música de compositores ligados com a igreja ou com o teatro. A fixação no repertório instrumental é, de facto, uma das características principais do que William Weber tem chamado o “musical idealism” (Weber 2008), uma construção social e estética que transformou um repertório musical concreto, o mencionado repertório instrumental que exclui a ópera e, ainda, os concertos de virtuosos, na representação de valores de clase, num princípio de carácter elitista e minoritário. O fenómeno não por evidente é menos importante. Condicionou a vida musical de todas as cidades ocidentais e a sua pervivência pode ser detectada até ao início do nosso século XXI. Em Portugal, o idealismo musical poderia ser vinculado com iniciativas públicas, que constituiram antecedentes históricos da Sonata. Entre elas, destaca-se, como referência histórica, a Sociedade Filarmónica, fundada pelo também compositor, antes citado, João Domingos Bomtempo na capital portuguesa em 1822 seguindo o modelo da Philharmonic Society de Londres. Permaneceu activa durante seis anos, durante os quais mostrou a intenção de renovar o repertório, e também o gosto musical coetâneo, apresentando obras clássicas de autores como Haydn, Mozart e Beethoven (Brito e Cramer 1990, Esposito 2016). Lopes-Graça, com efeito, como indiquei há pouco, sublinhou a importância do papel de Bomtempo no processo de modernização da vida musical lisboeta (Lopes-Graça [1934] 1989).
Em segundo lugar, há-de ser considerada a participação de Lopes-Graça na geração do modernismo, por assim dizer, sério e comprometido da década de 30, dentro da qual assumiu um perfil que se pode qualificar como intelectual (cf. Walter 2004, Fulcher 2005). Tendeu pontes artísticas, tanto com o legado do passado, como com a realidade que o circunscrevia (Cascudo 2003, 2008, 2011, 2013; Alves e Cascudo 2013). Em particular, devido à sua militância política e à sua pública oposição ao Estado Novo, o regime autoritário, muito conservador e nacionalista que vigorou em Portugal durante quatro décadas até ao 25 de Abril de 1974, Lopes-Graça nunca usufruiu da protecção das instituições estatais, e tanto o seu percurso profissional, como alguns dos projectos com os quais colaborou, foram dificultados até pelas instâncias oficiais (Carvalho 1989 e 2011).
Cabe aqui colocar a questão do significado das iniciativas privadas, inscritas na matriz liberal antes aludida, isto é, de sociedades como a criada por Lopes-Graça, no contexto imposto pelo chamado Estado Novo. Uma característica evidente das dictaduras do século XX foi o controlo total do aparelho do Estado, com consequências já estudadas no âmbito da cultura em Portugal (vejam-se, entre outros, Ó 1999, Silva 2005 e Trindade 2008) e também na sua vertente mais especificamente musical (veja-se Buch et al. 2016). Por exemplo, a dictadura franquista, embora diferente à portuguesa, também se caracterizou pela instrumentalização da cultura através da acção de instituições estatais (Pérez Zalduondo 2013, Pérez Zalduondo e Gan Quesada 2013). Nesse contexto, sem dúvida asfixiante e, ainda, marcado pelo nacionalismo de Estado, os espaços privados onde se escutava uma música considerada moderna e onde era possível participar, nem que fosse de maneira simbólica, de redes internacionais tinham uma relevância particular pelo seu carácter alternativo. Os concertos da Sonata participaram dessa relevância, adicionando-lhe uma dimensão de dissidência, tal como aconteceu, em âmbitos diversos, com a Biblioteca Cosmos, criada pelo matemático comunista Bento de Jesus Caraça (Fundação Calouste Gulbekian 2001) ou com a revista Seara Nova, que sempre combateu o fascismo e a dictadura (Clímaco 2016), antes mencionadas em relação com o ensaio de Lopes-Graça, Introdução à música moderna. Ficando pela comparação com o caso espanhol, seria seguramente revelador cotejar no futuro, por exemplo, a actividade e o repertório da Sonata com organizações como o contemporâneo Club 49, fundado em Barcelona pelo compositor Joaquín Homs, centrado num repertório similar e que também usufruiu do apoio do Instituto Francês (veja-se Homs 2001).
Voltando ao nosso caso, a militância comunista de Lopes-Graça faz com que seja possível relacionar a Sonata com a rede de academias culturais, criada ou dinamizada por membros do Partido Comunista Português e apoiadas por simpatizantes, sobretudo a partir da reorganização de 1943 efectuada sob a direcção de Álvaro Cunhal (Madeira 2013). Embora este seja um tema que não vou desenvolver, deve ser mencionada porque explica parte das dificuldades encontradas pela Sonata. Lopes-Graça, nos primeiros anos da década de 40: para além de fazer parte do Partido Comunista, foi um notado apoiante do Movimento de Unidade Democrática, cujo objectivo de carácter unitário era lutar contra a dictadura salazarista e instaurar um regime democrático em Portugal (Silva 1994). Antes disso, foi privado em 1939 dos direitos políticos durante cinco anos e sofreu as consequências da sua oposição “à situação” durante os seguintes e até ao fim do Estado Novo, tal como resumiu numa carta enviada ao diário República, na qual o compositor dá conta dos numerosos obstáculos profissionais com os quais se tinha deparado após o seu regresso de Paris, em Outubro de 1939. Um deles foi a sua separação da Sociedade de Escritores e Compositores Teatrais Portugueses: negando-se esta a incluir Lopes-Graça entre os seus administrados, tornava-se impossível a cobrança dos direitos de autor por qualquer apresentação pública da sua música em Portugal. Com efeito, a Sociedade exigiu que qualquer intérprete que desejasse tocar obras da sua autoria deveria apresentar uma declaração assinada pelo compositor, permitindo a execução e prescindido dos respectivos direitos (Lopes-Graça [1945a] 1974).[4]
Cabe, porém, salientar que Lopes-Graça tentou manter a imagen pública de Sonata à margem das questões partidárias.[5] Por exemplo, em carta endereçada pelo compositor ao médico e escritor Arquimedes da Silva Santos, então também militante do PCP, o compositor tecia diversas considerações acerca das dificuldades que ia atravessando a Sonata. Referia nomeadamente os comentários negativos do crítico do Diário Popular a propósito de um concerto onde tinham sido incluída a música do compositor polaco Karol Szymanowski. No ano em que foi escrita a carta, tinha sido programado por duas vezes e com bastante sucesso o ciclo vocal Le muézzin passionné op. 42 (1918), para além de um par de mazurcas e os Mitos para violino e piano, de 1915. Na carta, Lopes-Graça queixava-se do dogmatismo de alguns “camaradas” de Lisboa, afirmando o princípio de que, em matéria de arte, essa atitude era de todo recusável. Lopes-Graça menciona aliás nesta correspondência a saída de vários membros do PCP da sociedade Sonata, assim como as consequências que isto tinha tido e viria ter no futuro para o financiamento da sociedade.[6]
Também está documentada esta questão no arquivo da Sonata, em duas cartas endereçadas ao compositor, e assinadas pelo escritor João José Cochofel e pelo mesmo Arquimedes da Silva Santos. Pode se ver nelas certa pressão para transformar a Sonata numa organização “progressista”. Estas cartas surgem no contexto da organização de sedes da sociedade em Coimbra e no Porto. Para isto, Lopes-Graça contou com o apoio dos mencionados Cochofel e Silva Santos em Coimbra, e, ainda, de Fernando Vale, de Luísa Herculana Alves de Carvalho e do seu irmão, Guilherme de Carvalho, no Porto. Todos eles eram oposicionistas e, na altura, apoiavam o Movimento de Unidade Democrática.[7] Para ilustrar o debate sobre este assunto desenvolvido no grupo, basta o seguinte excerto, assinado por Cochofel em Novembro de 1945:
Todos nós (Arquimedes, Valle e eu) chegamos ao acordo de que se deveria aproveitar a efervescência que ali reina para lançar a Sonata como coisa “progressiva”, que lhe traria com certeza muita gente, sem no entanto fazer as coisas de tal maneira que a pudessem prejudicar. Para isso, julgávamos talvez útil distribuir umas circulares, com um palavreado adequado pelas faculdades, Belas Artes, etc. O Arquimedes e o Valle conhecem rapazes que se encarregariam disso, gente conhecida da Luísa de Carvalho. Algumas dessas pessoas formariam com a Luísa [de] Carvalho a comissão do Porto, de que o Cláudio Carneyro ficaria presidente, mais ou menos honoris causa…[8]
Em carta junta, Arquimedes apontava para a mesma ideia:
O Porto ferve, e em grande parte com o fogo da juventude, e juventude de todas as escolas; estive lá há oito dias e vi. Não será bom canalizar certa pressão para Sonata, já que as coisas estão como estão? Se entender que os jovens com quem estou em contacto podem servir, parece-me que a circular deveria ter um tom de chamada da juventude do Porto à música moderna, à Sonata. Isto claro sem explicitamente apresentar uma nítida posição política da Sonata.[9]
Aparentemente, o plano de ambos não teve consequências imediatas. Aliás, em Janeiro de 1946, ou seja, três meses depois, Cochofel enviou para Lopes-Graça uma segunda carta, na qual pedia instruções definitivas e propunha que o próprio compositor se deslocasse ao Porto para organizar a acção:
O Valle andou por lá [Porto] a apalpar terreno e ficou com a impressão de que ninguém se entende bem sobre o que há de fazer. Tenho a impressão de que seria bom tu ali ires pessoalmente para reunires as pessoas interessadas e distribuíres tarefas concretas a cada uma delas.[10]
Este desejo de transformar a programação da Sonata numa afirmação de carácter político também aparece plasmado numa carta assinada por Luís de Freitas Branco, um dos mestres de Lopes-Graça no Conservatório Nacional de Música durante o seu período formativo. Datada em Dezembro de 1946, Freitas Branco perguntava-lhe nela a Lopes-Graça se estaria disposto a abandonar “a preferência pelo modernismo de tipo burguês que ainda podia dar alguma coisa em 1922 e talvez até 1939 no sentido de déblayage [afastamento] da antiga linguagem, mas [que] já exerceu a sua função histórica”. A proposta, nas palavras de Freitas Branco, seria sustituí-lo pela música vinda de “países progressistas”.[11]
Mais adiante, comprovar-se-á, na análise da programação da Sonata, que Lopes-Graça não seguiu o conselho. Isto não significa, porém, que Lopes-Graça não estabelecesse uma ligação entre a composição moderna e a função social da música. O que parece que não estava disposto a aceitar era a imposição de dogmas que respondiam apenas a uma lógica partidária, e não a uma curiosidade legítima pelo que podiam oferecer os novos caminhos seguidos pela composição musical. São numerosas as fontes que documentam esta posição na abundante produção jornalística assinada por Lopes-Graça durante as décadas de 40 e de 50 (Cascudo 2008). Quanto à questão da função social da música moderna, debruçou-se nela nos dois últimos capítulos da Introdução à música moderna, ensaio antes citado. O compositor defendia uma interpretação que podemos qualificar de formalista da música, independentemente dos laços de parentesco que também deviam ser estabelecidos entre a música produzida num período dado e o seu contexto e circunstâncias históricas. A música era a expressão do seu tempo, mas essa expressão era multifacetada, tendo por conteúdo a “consciência social moderna”:
A uma consciência social em crise o que pode corresponder senão uma arte em crise? Se alguns compositores modernos têm procurado, na “especialização” das suas experiências de ordem técnica ou no culto de uma arte demasiado ensimesmada e aristocratizada, uma fuga a um mundo que os choca pelo que tem de brutal, de desordenado, de caótico e de problemático (e em todos os tempos houve destes delicados), outros, porém, não hesitam em fazer-lhes frente, em imiscuir-se na “confusão” ou, quando não comparticipantes na luta, ao menos conservando bem viva e desperta a sua personalidade humana, para que nas suas obras sempre se traduza fatalmente um que outro aspecto do drama (ou da comédia), que se desenrola no tablado da nossa época (Lopes-Graça 1942, 104-5).
Para além de o fazer na Introdução à música moderna, Lopes-Graça exprimiu os mesmos pontos de vista em outros artigos contemporâneos. Assim, por exemplo, em 1941, defendeu uma posição tolerante em relação à conciliação da militância política com a criação artística:
Finalmente, julgo conveniente esclarecer que, ao reclamar para a música um mais estrito contacto com o povo, não entendo dever imolá-la como arte, a qualquer doutrinação ideológica num sacrifício ou compromisso que não aproveita nem à arte nem à ideologia, embora não vá cair na ociosa querela da “arte pura” contra a “arte social”, visto achar que toda arte é pura, quando profundamente sentida e talentosamente defendida nas suas “impurezas”, assim como também não deixa de ser arte aquela outra que, por “puríssima” que seja, obtém a aceitação do maior número de homens (Lopes-Graça [1941] 1989, 81).
O que, portanto, foi sempre fulcral na programação da Sonata foi a consideração de uma esfera específica da arte musical, da qual faziam parte as ideias de moderno e de internacionalismo, aliadas à uma ideia de cultura que incluia a confiança na bondade intrínseca que tinha o conhecimento de primeira mão, através da audição neste caso, das tendências do presente, tal como a necessidade de manter viva a familiaridade com as novidades literárias era uma predisposição comum no meio intelectual em que Lopes-Graça se movimentou durante as décadas de 30 e de 40, tanto em Coimbra como em Lisboa. Essa concepção da arte musical não contemplava, porém, a sua autonomia com respeito ao social e, sobretudo, com respeito ao humano.[12]
“Cremos não exagerar afirmando que a música moderna é ainda quase totalmente desconhecida em Portugal”. Com esta frase, a primeira que se pode ler no programa de mão, se apresentou Sonata ao público lisboeta. É admissível atribuir a autoria do texto ao próprio Lopes-Graça. De facto, embora o compositor tivesse um contacto bastante informado com o modernismo musical desde os seus anos de formação e desde a época das primeiras audições de obras da sua autoria, em Lisboa, nos anos 30 e como o próprio explica:
Os nomes dos novos compositores não eram desconhecidos do grupo reduzido que se mantinha informado da vida musical, através de revistas internacionais e da consulta dos catálogos das editoras. Uma figura central era Luís de Freitas Branco, que tinha muita literatura musical moderna e a quem todos recorríamos. Foi através dele –que me emprestou o Pierrot Lunaire– que eu conheci Schönberg. Outra figura a recordar foi D. Ema Santos Fonseca Câmara Reis, que coleccionara uma biblioteca musical única no País. [...] Tudo era no entanto e naturalmente muito difícil. Apesar dos esforços que, em fins de 20 e inícios de 30, fez também Pedro de Freitas Branco com os concertos do Tivoli, apresentando música contemporânea (Jacques 1986).
O público criado pela mencionada Ema da Câmara Reis a partir de 1923 através dos concertos da Divulgação Musical era também aquele que manifestava algum interesse pelas obras dos jovens compositores. Por exemplo, foi este público que assistiu ao primeiro dos concertos inteiramente preenchido por obras de Lopes-Graça em 1936. Pelo menos é o que se deduz de uma crônica de Luís de Freitas Branco sobre o mesmo, onde é assinalada a sua importância, juntamente com os concertos promovidos pela Divulgação Musical, no contexto da programação musical da época. Essa importância é explicada no mesmo texto pela referência ao papel que tiveram como “propagandistas” da música “bitonal, politonal e atonal” (Branco 1936). O que me interessa salientar com estas referências é que, independentemente da realidade da vida musical lisboeta quanto à audição de obras modernas, ainda por estudar, a percepção que deste facto tinha Lopes-Graça era que se tratava de uma actividade desenvolvida por uma “reduzida minoria” –é a expressão usada no programa de mão– e que estava desligada da habitual vida de concertos que, por sua vez, depois da crise de 1929 e durante a guerra, tinha perdido grande parte da sua vitalidade.
O primeiro fenómeno não era específico de Lisboa (Weber 2003), embora, dadas as características da vida cultural da cidade, se percebesse de forma particularmente aguda. O musicólogo Santiago Kastner deixou isto explícito na crítica que fez ao primeiro concerto da Sonata:
Na vida musical lisboeta sentia-se a falta dum organismo que desse a conhecer em larga escala as melhores e mais significativas obras da música contemporânea, conhecimento absolutamente indispensável a todos quantos se dedicam à música. Visto as modas e novidades literárias chegarem a Portugal bastante depressa, não sei explicar porque não se verá a música favorecida pela mesma rapidez (Kastner 1943).
Dava como referência a audição da Sinfonia de Matias o Pintor, de Paul Hindemith, que tinha levado nove anos para ser ouvida em Lisboa, quando em 1934, isto é, antes da Guerra Civil e do início da Segunda Guerra Mundial, se tinha apresentado em Madrid, Barcelona e Bilbau. A explicação desta distância no tempo também não faz parte dos objectivos deste artigo. O que interessa, de novo, é reter a ideia de que o diagnóstico era partilhado, como também se pode verificar nas críticas ao primeiro concerto assinadas por José Blanc de Portugal e Francine Benoit, respectivamente nos jornais Acção e O Século, conservadas no arquivo da Sonata.
O que não era consensual era o que se podia e se não podia considerar “música moderna”. Se entendermos, em primeiro lugar, moderna como sinônimo de contemporânea, a programação de Sonata foi muito consistente. Do ponto de vista cronológico, as obras programadas foram compostas num intervalo de tempo que se expande ao longo das seis décadas transcorridas entre Verklärte Nacht (1899) e os Cinco noturnos para piano (1959) de Lopes- Graça. Uma percentagem pequena está constituída por obras compostas antes ou durante a Primeira Grande Guerra. O 44% delas foram escritas no período de entre duas guerras e, o que é notável, perto do 40% do total de obras programadas foram escritas com posterioridade a 1940. Não admira, em consequência, que a esmagadora maioria dos compositores programados, perto do 93%, fossem compositores vivos ou que faleceram durante o período de funcionamento de Sonata. Entre estes últimos conta-se Anton Webern, do qual foram ouvidas obras em 1954, nove anos após o seu falecimento.
Este assunto motivou, logo após o primeiro concerto, uma crítica do musicólogo Santiago Kastner, o qual assinalou pertinentemente a questão da variedade de significados que era possível atribuir ao adjectivo moderno. Tendo sido escritas todas as obras incluídas nesse concerto no século XX (Tabela 1), delas, na sua opinião, apenas a Sonata para piano (1926) de Béla Bartók era uma obra que falava uma “linguagem nova e pessoal” e que abria “horizontes inéditos” (Kastner 1943). De estilo muito diferente, a crítica publicada no Diário Popular após o segundo concerto sintetizou os preconceitos contra os quais Lopes-Graça lutava (F. 1943). Patrocinado pelo Instituto Francês em Portugal, do programa deste segundo concerto constavam quatro sonatas de Henri Martelli, Darius Milhaud, Maurice Ravel e Albert Roussel, as quais foram interpretadas pelo violinista Robert Soetens e a pianista Suzanne Roche. No texto, a equivalência entre música moderna e música desagradável constitui a ideia principal, assim como a afirmação de que a dita desagradável música moderna só podia interessar a uma minoría.
Estas duas posturas, cabe frisar, não são, de todo, equiparáveis: a de Kastner era uma crítica fundamentada, enquanto o escrito no Diário Popular expunha apenas preconceitos. Mais ainda, nesta segunda crítica eram citadas, fora de contexto, apreciações que, nas notas do programa de sala, se teciam a propósito de Ravel. Porém podemos pensar que ambas colocaram Lopes-Graça numa posição complicada, o qual pode explicar que interviesse directamente escrevendo um artigo na Seara Nova relacionado com o mencionado segundo concerto da Sonata e enviando uma carta ao director do Diário Popular. Lopes-Graça era colaborador da Seara Nova desde a década de 30, mas, no artigo, foi devidamente identificada a sua condição de “dirigente” da sociedade (Lopes-Graça 1943). O que Lopes-Graça fez foi traçar uma síntese da história da música francesa para violino, sublinhando como conclusão os aspectos mais relevantes das quatro obras ouvidas. Ou seja, as obras foram apresentadas no contexto de uma evolução histórica –nas notas de programa, conservadas no arquivo da AAM, falava-se com efeito de uma “evolução natural da arte” combatida por “espíritos refractários”– que valia a pena acompanhar, mesmo que pudesse provocar alguma estranheza: de facto, ele próprio reconheceu aí por escrito que a sonata de Martelli, de 1937, era “bastante árida no seu complicado contrapontismo, fruto porventura de certa doutrinação neo-clássica, que nem sempre produziu os mais cativantes resultados” (Lopes-Graça 1943, 194). Este texto revela, de facto, uma atitude que podemos qualificar de pedagógica e que também podemos vincular directamente com a orientação da Sonata tal como, aliás, se manifestou nas breves explicações que acompanharam cada um dos concertos, que serão comentadas mais adiante.
Seara Nova publicou, para além dos mencionados artigos de Kastner e de Lopes-Graça, um terceiro artigo, assinado por Daniel de Sousa, que constitui outro exemplo de crítica de carácter ensaístico (Sousa 1943). O artigo foi publicado a propósito do terceiro concerto da Sonata, em que foram tocadas obras de Alfredo Casella, Claude Debussy, Gian Francesco Malipiero, Darius Milhaud, Francis Poulenc, Stravinsky e, do próprio Lopes-Graça, canções sobre poesia de Adolfo Casais Monteiro e de José Gomes Ferreira, os quais se opunham, tal como ele, à dictadura salazarista. No ensaio, Daniel de Sousa colocou a questão da expressão da música moderna em termos que introduzem a questão da relação entre “a arte e a vida”, um tópico discutido nos debates intelectuais da esquerda portuguesa desde fins da década de 30 (vejam-se, para uma síntese do ponto de vista dos estudos literários, Pita 2000 e, ainda, entre outros, Henriques 2010, Costa Dias 2011, Fitzgibbon 2013). Basicamente, o que o autor afirma é que as obras até então programadas mostravam o “momento evolutivo” em que se encontrava a arte em geral e a música em particular de “contradição” entre a “técnica de expressão artística” e os “processos da vida social do homem”. Tendo deixado atrás o “sensualismo consonante” própria da música concebida apenas para deleitar, os músicos contemporâneos tinham-se abandonado a um tecnicismo apenas apreciado por uma elite. Como é óbvio, detectam-se nestas ideias ecos do discurso anti-formalista difundido pelo comunismo na época: o autor conclui, com efeito, afirmando que as obras ouvidas são o resultado “da especulação formalista” e desejando, para a Sonata, a futura realização de concertos “dentro de uma verdadeira compreensão da arte e da vida como pede a consciência estética da humanidade que aspira à sua emancipação” (Sousa 1943, 273).[13]
Sonata contou logo com três apologistas no âmbito da crítica musical: Francine Benoit e José Blanc de Portugal e, ainda, a revista Arte Musical, dirigida por Luís de Freitas Branco. De forma sistemática, tentaram destacar para os seus leitores o que havia de interessante nas obras programadas. É também evidente a sua proximidade com as ideias e a atitude de Lopes-Graça, o qual não quer dizer que se limitassem a repetir o que comentavam as notas ao programa. Podemos ilustrar o que foi afirmado usando como amostra a resposta à peça de Martelli nas críticas que publicaram a propósito do mesmo segundo concerto da Sonata. Benoit publicou duas críticas em dias sucessivos nos jornais O Século e Diário de Notícias (Benoit 1943a, Benoit 1943b). Nelas, a obra de Martelli foi apresentada nos seguintes termos: “figurou com a sua sonata de violino e piano com honra ao lado das esmagadoras vizinhas que eram [as composições de] Milhaud, Roussel e Ravel” (Benoit 1943a) e “áspera, laboriosa na sua contextura, as suas intenções são traduzidas com pouca ou nenhuma espontaneidade” (Benoit 1943b). Por seu turno, Blanc de Portugal, o qual colaborou igualmente nestes anos em mais do que um jornal, nomeadamente em Acção e no Diário da Manhã, despachou-a da seguinte maneira: “a obra cronologicamente mais recente que nos apresentou a Sonata e também musicalmente a mais desenxabida obra que lá se tocou” (Blanc de Portugal 1943).
Como afirmei há pouco, a revista Arte Musical manifestou-se em defesa do projecto da Sonata em Janeiro de 1943, publicando três peças jornalísticas: uma espécie de editorial não assinado, mas seguramente da autoria de Freitas Branco, intitulado “A propósito da realização de Sonata”, uma crítica ao primeiro concerto assinada pelo compositor Joly Braga Santos, aluno do mesmo Freitas Branco, e uma segunda crítica ao concerto seguinte assinada por José Luís Conceição da Silva ([Branco] 1943, Santos 1943 e Silva 1943, respectivamente). Na primeira peça, encontramos ideias já vistas, segundo transcrevemos a seguir:
Há já muito tempo que no nosso país se estava fazendo sentir a falta duma organização deste género pois infelizmente encontramo-nos dentro do “campo da música”, num atraso tal que, tirando uma meia dúzia de pessoas inteligentes e de ideias novas que se encontram no nosso meio, raros são aqueles que conseguem compreender o verdadeiro sentido das obras de um Strawinsky ou de um Paul Hindemith ([Branco] 1943, 3).
Sobretudo, Freitas Branco aproveita o ensejo para denunciar a ignorância com a qual se condenava a priori, e, por vezes, por parte de críticos musicais, o “modernismo em qualquer ramo da actividade humana”. A revista de facto afirmou expressamente que partilhava os objectivos da Sonata no sentido de expandir o conhecimento e a apreciação pela música moderna: mesmo que os concertos fossem menos conseguidos do ponto de vista artístico, tomaria sobretudo em consideração a sua vocação divulgadora (Silva 1943).
Como resposta aos primeiros concertos da Sonata, a crítica musical dividiu-se portanto em quatro sectores. Dois deles foram maioritários: o dos críticos “refractários” à música moderna que acabaram por silenciar o projecto nos seus jornais e o dos críticos partidários da mesma, próximos de Lopes-Graça e entre os quais se destacaram Francine Benoit, João Blanc de Portugal e os colaboradores de Arte Musical. Todos eles optaram por contribuir para o projecto pedagógico da organização, tentando explicar os motivos pelos que se deviam valorizar as obras programadas. Temos ainda a posição por assim dizer não alinhada de Santiago Kastner, o qual, manteve uma marcada distância com respecto do projecto e que, apesar de concordar com a sua pertinência, não evitou assinalar as deficiências musicais e todos aqueles aspectos com os quais estava em desacordo ou que achava não terem sido bem conseguidos. E finalmente, encontramos a das escassas críticas provenientes do âmbito comunista que reclamavam da Sonata uma intervenção decidida no sentido, definido por Daniel de Sousa, da “emancipação total” da humanidade. Cabe frisar que a posição da crítica ilustrada através destes exemplos é apenas uma amostra, embora se possa apontar a permanência destas tendências comuns na resposta dos jornais ao longo da história da Sonata.
Entre 1944 e até Julho de 1949, a Sonata conheceu o seu período de maior dinamismo. Atingiu os onze concertos na temporada de 1948. A partir de 1950, e até ao fim da sua actividade em 1960, em nenhuma temporada foram programados mais de cinco concertos. O repertório da Sonata dependeu das condições nas quais desenvolvia a sua actividade, o que limitou bastante as opções relativamente à escolha de intérpretes. Foram no total executadas 447 peças[14] da autoria de 123 compositores originários de duas dezenas de países (Tabela 2). A música francesa está representada com excepcional frequência, atingindo perto do 30% do repertório programando, não apenas como consequência das afinidades do compositor com a cultura gala, mas como consequência do apoio recebido por parte do Instituto Francês em Portugal (Cascudo 2016). A música de autores portugueses ocupou o segundo lugar em termos de frequência da programação, atingindo perto do 19% do total. As obras do próprío Lopes-Graça foram apresentadas em trinta e seis ocasiões –onze das quais, em primeira audição–, o que constitui pouco mais do 40% das obras de autores portugueses programadas.
Lopes-Graça nunca chegou a explicar ao pormenor os motivos puramente programáticos pelos que umas obras apareciam juntamente com outras nos concertos, em grande parte porque a decisão final dependia fundamentalmente dos meios e dos músicos disponíveis. Há casos excepcionais de concertos monográficos, como, por exemplo, entre outros, os seguintes: os dois dedicados aos quartetos de Bartók em Maio de 1948, financiados pelo Círculo de Cultura Musical; a Daniel-Lesur em Fevereiro de 1952, patrocinado pelo Instituto Francês em Portugal; ao próprio Lopes-Graça em Fevereiro de 1954; ou os concertos in memoriam Freitas Branco em Janeiro de 1956. Porém, estão documentadas outras iniciativas nas quais participou Lopes-Graça onde se evidenciaram as relações entre a música escutada e questões históricas ou estéticas. Asim, um dos exemplos mais claros do estabelecimento deste tipo de vínculos é a escolha de obras de Prokofiev e de Bartók para ilustrar uma conferência do já mencionado Cochofel, posteriormente publicada na Seara Nova, “A música e o nosso tempo” (Cochofel 1943), pensada para introduzir um recital na Casa do Alentejo, em Junho de 1943, interpretado por Maria da Graça Amado da Cunha, mas que não chegou a ser realizado. As peças então ouvidas foram as Vinte visões fugitivas de Prokofiev, em primeira audição pública portuguesa, e três Burlescas e a Sonata de 1926 de Bartók. Todas elas se escutaram igualmente na Sonata, tocadas pela mesma pianista que também se responsabilizou por muitas das tarefas administrativas da sociedade.
Também podemos aludir aos dois recitais de poesia e música organizados na Academia de Amadores de Música por estudantes ligados ao MUD, em Junho de 1946. A divisão em dois corresponde a uma das representações teóricas da história da literatura portuguesa do século XX, onde se diferenciam os autores e obras associados à revista Presença e os autores da geração neo-realista. Curiosamente, as obras de Lopes-Graça, o qual tinha estado bastante ligado aos fundadores da Presença e tinha chegado a publicar nas suas páginas, foram incluídas no segundo destes recitais, que começou por uma conferência sobre o significado do Novo Cancioneiro seguida da recitação de poemas de autores ligados com este grupo, tais como Manuel da Fonseca, Joaquim Namorado, Álvaro Feijó, Sidónio Muralha e Mário Dionísio, alguns dos quais que também aparecem no volume de Marchas, danças e canções, com música do nosso compositor, publicado e imediatamente apreendido pela censura em 1946. Juntamente com a música de Lopes-Graça foram ouvidas obras de Béla Bartók, Sergei Prokofiev, André Jolivet e Jean Hubeau, que se reencontram presentes nos programas da Sonata. O primeiro dos recitais começou com uma conferência acerca dos movimentos literários associados às revistas Orfeu e Presença, seguida da declamação de poesias de autores ligados a elas e de um pequeno concerto preenchido por obras de Luís de Freitas Branco, Igor Stravinsky y Karol Szymanowski, as quais foram comentadas por Francine Benoit. Também estes compositores aparecem representados na programação da Sonata (veja-se Apêndice I).
A perspectiva que nos proporcionam os programas destes concertos e, sobretudo, o que sobre eles disseram os seus organizadores, permite-nos fazer uma leitura do mesmo tipo no que diz respeito aos autores e obras que foram, por exemplo, escutados no primeiro dos concertos da Sonata (Tabela 1). Todos os compositores eram então ainda vivos. As peças tinham sido escritas no período entre as duas guerras mundiais para trio, voz e piano e piano solo, isto é, tratava-se de música de câmara como foi o habitual nestes concertos. Foi ainda incluído um compositor português considerado por Lopes-Graça o introductor do modernismo em Portugal: o já mencionado Luís de Freitas Branco (Lopes Graça [1954] 1989). Louis Durey, cuja música fez parte dos concertos da Sonata em apenas uma ocasião, era, na altura, comunista, enquanto Alexandre Tansman, cuja música foi ouvida um total de quatro vezes, era judeu. Aludo a estes dois factos pelo evidente posicionamento prosoviético e antinazista que o contexto histórico permite ver no facto de terem sido programados neste primeiro concerto da Sonata. Aliás a comparação entre a “melhor música” de Tansman e a “menos bela” suite de Bach, resolvida claro está em favor deste último, feita no Diário Popular, na crítica ao segundo concerto da Sonata antes citada, no qual a música do primeiro não se ouviu, deveria, talvez, ser lida neste contexto. Por último, Bartók era, na opinião de Lopes-Graça, um dos compositores mais importantes do século XX, ao qual dedicou vários artigos e as oito suites progressivas para piano In memoriam Béla Bartók, escritas entre 1960 e 1975.
No entanto, não deve ser estabelecida uma correlação unívoca entre a frequência com que determinados compositores foram programados e aquilo que Lopes-Graça escreveu sobre eles nos jornais (veja-se, para uma síntese, Cascudo 2008). É, aliás, relevante sublinhar que o trabalho de divulgação da música moderna realizado por Sonata teria ficado incompleto sem o concurso dos projectos jornalísticos e editoriais nos quais Lopes-Graça também participou nas décadas de 40 e de 50. Por exemplo, Manuel de Falla foi apenas ouvido em quatro ocasiões, enquanto que Lopes-Graça escreveu sobre ele vários artigos e tencionou, em 1961, dedicar-lhe uma obra que não chegou a concluir: O túmulo de Manuel de Falla. Podemos considerar um segundo exemplo, que também tem a ver com compositores de origem espanhola: os irmãos Ernesto e Rodolfo Halffter. Em 1948, a Sonata estreou em Lisboa a obra para piano Homenaje a Antonio Machado op. 13, escrita por Rodolfo em 1944 durante o seu exílio mexicano. Nas notas de programa foi apresentado de forma explícita como sendo um compositor ligado à causa republicana que tinha sido obrigado, depois do triunfo dos nacionalistas, a abandonar Espanha. Não foi, porém, nunca apresentada nenhuma obra de Ernesto que, na altura, vivia em Portugal e que mantinha vínculos profissionais e pessoais com o Estado Novo (Contreras 2011). No entanto, por um lado, o facto de Lopes-Graça, em 1940, ter elogiado a Rapsódia portuguesa, da autoria de Ernesto, como um modelo possível para a integração das referências a música popular em obras de carácter orquestral é prova da sua imparcialidade (Lopes-Graça [1940] 1986). Mais ainda, em 1952, pouco antes da adesão de Espanha à UNESCO, Sonata incluiu num dos seus concertos uma obra de Joaquín Rodrigo, as Danzas de España, ao tempo que, em 1946, também se tinha escutado, por exemplo, a Sonata em homenagem a Federico García Lorca de Francisc Poulenc (a homenagem de Rodolfo Halffter a Antonio Machado, falecido de caminho ao exílio em 1939, deve ser interpretada no mesmo sentido). Por outro lado, é também evidente que a presência ou a ausência de determinados compositores e de determinadas obras numa iniciativa organizada por Lopes-Graça, claramente marcado como oposicionista em Portugal, tinha inevitáveis connotações políticas. Tal como ele próprio afirmou a propósito de um projecto diferente, as Marchas, danças e canções, era necessário actuar de forma “intencional”, mas “viável”, de maneira a atingir os fins “dentro do presente estado de cosas” (citado em Cascudo 2016, 179).
Ao longo de 51 concertos, até 5 de Julho de 1949, introduziram todos os programas umas notas não assinadas que introduziam cada um dos autores e as suas obras. Quando as peças programadas eram vocais, publicava-se o texto verbal em que se baseava. O estilo utilizado nestas notas é bastante homogêneo. Podemos tomar como exemplo ilustrativo as primeiras notas redigidas, destinadas a apresentar o programa resumido na Tabela 1. Assim, as duas frases dedicadas a Luís de Freitas Branco contêm um misto de informação e de valoração em termos críticos. Proporciona-se a data de nascimento, afirma-se que é “sem dúvida o mais notável compositor português da actualidade” e diz-se, ainda, a data de composição dos Prelúdios e assinala-se o facto de terem sido dedicados a Viana da Mota. Quanto à valorização do autor e da sua obra os termos utilizados são: seriedade, solidez técnica e renovamento, neste caso, da música de teclado em Portugal. No caso de Bartók, para além desses dois aspectos, encontramos um comentário de preparação para a audição de carácter expressivo: a Sonata para piano não faz concessões à doçura nem a lirismo o que lhe confere uma “violência” e um “dinamismo” implacáveis. Ainda, quando resulta evidente, alude-se a questões de técnica, por exemplo, no comentário à Sérénade de Tansman, a propósito da qual se menciona o seu jazzismo, baseado em harmonias debussystas e na frequência das síncopas. A eficácia desta maneira de comunicar com a audiência foi posta em dúvida. Numa das crónicas antes mencionadas, pode se ler a sugestão da conveniência de diálogo directo na sala de concerto entre os organizadores ou os músicos e a assistência (Silva 1943). Do ponto de vista do conteúdo, debe ser tomado em consideração que a concisão dos textos impõe um estilo específico, que resulta por vezes enfático e rotineiro como consequência da referida brevidade, e bastante próximo do jornalismo.
Este trabalho divulgador tinha, ainda, uma outra faceta, ligada com o propósito de Lopes-Graça de estabelecer vínculos com a cena internacional da composição contemporânea. Isto explica a constância com que tentou transformar Sonata numa filial da Sociedade Internacional de Música Contemporânea (sobre a SIMC e as suas implicações político-musicais vejam-se Haefeli 1982, Haefeli 2005 e Schreffler 2015). Sonata fez parte da SIMC entre 1947 e 1951. Teve de a abanóonar devido à impossibilidade de dar resposta às obrigações financeiras que tal implicava, assim como devido a motivos que tinham a ver com o reduzido peso que tinham as filiais mais frágeis (Lopes-Graça [1952] 1974). A passagem da Sonata pela SIMC foi bastante efémera, mas nem por isso foi menos reveladora das intenções de abertura que apoiaram a decisão de fazer parte de uma organização internacional. Lopes-Graça chegou a deslocar-se em 1948 e em 1949 a Amesterdão e a Palermo, na sua qualidade de secretário da filial portuguesa da Sociedade Internacional. O compositor descreve da seguinte maneira a natureza das relações entre as duas sociedades:
Nos começos de 1947, logo que foi possível restabelecer entre os povos os laços pacíficos da cooperação intelectual e artística, Sonata teve a satisfação de ver a sua acção reconhecida fora das fronteiras pátrias com a sua admissão no seio da Sociedade Internacional de Música Contemporânea, passo importantíssimo para a divulgação da nossa música e dos nossos compositores actuais no estrangeiro e que até então não tinha sido possível dar. Infelizmente, não devia ali permanecer muito tempo, tendo sido forçada a pedir a demissão em 1951, devido não só às suas dificuldades em cumprir as obrigações financeiras impostas pelos estatutos da Sociedade (amavelmente aplanadas, deve-se confessá-lo, pela Assembleia dos Delegados), mas também por divergências de critérios quanto ao funcionamento dos Júris Internacionais e à representação das Secções Nacionais nos Festivais da Sociedade, objecto de profundas alterações nos estatutos desta (Lopes-Graça [1952] 1974, 163).
Foi, porém, em Janeiro de 1946, quando Lopes-Graça enviou uma carta ao presidente da SIMC, solicitando a admissão da Sonata para assim desenvolver as relações musicais entre Portugal e o resto da Europa.[15] É uma prova indirecta que aponta para o que foi o seu principal objectivo do ponto de vista organizativo: tentar fazer parte de uma rede internacional na qual fosse possível “distribuir” as obras musicais da sua autoria, mas também as realizações dos restantes compositores portugueses vivos. Passados três meses, Sonata não tinha recebido qualquer resposta da SIMC, pelo que Lopes-Graça insistiu, explicando de novo o programa da sociedade, “instituição que, sob a minha orientação e fora de qualquer objectivo comercial, se consagra em Lisboa a dar concertos exclusivamente preenchidos por obras de música contemporânea”.[16] Na carta, refere-se que, através da BBC, teria sido feito um apelo para os compositores portugueses submeterem obras para o primeiro festival da SIMC organizado depois da guerra. Sonata, porém, não tinha recebido ainda nenhuma confirmação de que fosse considerada como a secção portuguesa da SIMC.
Sonata fez, por sua parte, a 10 de Dezembro de 1946 um apelo para os compositores portugueses comparecerem a uma reunião nas instalações da casa Valentim de Carvalho, prevista para quatro dias depois.[17] Foi uma das tentativas de contacto com os compositores activos em Portugal que se documentam no fundo consultado. Assim, por exemplo, em Agosto de 1947 foi enviada uma circular a Luís de Freitas Branco, Francine Benoit, Frederico de Freitas, Jorge Croner de Vasconcelos, Armando José Fernandes, Joly Braga Santos, Claudio Carneiro, Eurico Tomaz de Lima, Maria Isabel Lupi e Vítor Macedo Pinto em que se perguntava se tinham alguma obra recente para ser executada na próxima temporada.[18] Na temporada 1947/1948 foram, de facto, executadas na Sonata para violino de Joly Braga Santos; a Sonata para piano de Frederico de Freitas; Carrilhões de bronze e de prata, de Cláudio Carneiro; e Estudo e Sonatina, de Armando José Fernandes.
Ainda, são também evidentes no arquivo as tentativas de estabelecer contactos com outras secções nacionais mediante a programação da música dos seus responsáveis. Por exemplo, Godofredo Petrassi respondeu, em Outobro de 1947, a uma carta na qual a Sonata lhe informava de que as suasInvenzioni iriam fazer parte da programação.[19] Foram, com efeito, estreadas pela pianista Maria Elvira Barroso em Outubro de 1948. Não consta, porém, nesta documentação, que a Academia Filarmónica Romana programasse nenhuma obra de Lopes-Graça, em particular, o programa com peças vocais da sua autoria interpretado em colaboração com Arminda Correia, mencionado na carta de Petrassi em resposta à proposta do compositor português. Também, desde o Brasil, H. J. Koellreutter escreveu, a 28 de Novembro de 1947, uma carta em que agradece os livros e a informação sobre a Sonata e se compromete a enviar obras dos compositores componentes do grupo Música Viva.[20] O mesmo aconteceu com Óscar Esplá, o qual lhe informou que tinha solicitado aos compositores espanhóis no exílio que enviassem obras para a Sonata depois de ter recebido uma carta do próprio Lopes-Graça informando, como nos casos anteriores, da existência e funcionamento da sociedade.[21] Ainda, outras secciones, como o Sindicato dos Compositores Checos, em Praga, em Dezembro de 1948, enviaram cartas similares, nas quais agradeciam a programação de obras de autores checos ou se comprometiam a enviar novas obras.[22] No arquivo consta, finalmente, cópia da carta enviada por Fernando Lopes-Graça para Artur Malawski, de quem a Sonata interpretou duas peças em 1949 e 1950, em resposta ao seu pedido de informação sobre as comemorações chopinianas em Portugal e sobre obras recentes de compositores portugueses. Lopes-Graça excusa-se com a impossibilidade de encontrar obras impresas e a reticência dos compositores a enviar peças manuscritas. Assim, só tinha conseguido enviar cópia do Lento para orquestra de cordas de Luís de Freitas Branco, a Sonata para violino e piano de Francine Benoit, oPrelúdio, capricho e galope, da sua autoria e oQuarteto concertante de Frederico de Freitas.[23] Consta que houve tentativas de estabelecer contactos com outras organizações similares, como a Moderne Musik, dirigida em Hamburgo por Herbert Hübner, em 1952,[24] ou a Secção Musical da União das Sociedades Soviéticas de Amizade e Relações Culturais com o Estrangeiro, em Setembro de 1958.[25]
Em Maio de 1950, Sonata decidiu abandonar a SIMC, como se documenta na cópia da carta endereçada ao seu presidente e assinada por quem constava oficialmente como director da secção portuguesa, Luís de Freitas Branco, e pelo secretário, o próprio Lopes-Graça. Nenhuma das obras de autores portugueses enviadas tinha sido seleccionada para ser programada em nenhum dos festivais organizados nos quatro anos durante os quais Sonata tinha feito um enorme esforço para cumprir com o pagamento da correspondente assinatura.[26] Aceitando que aquelas obras pudessem não ser suficientemente interessantes, protestam porque, nos Festivais, foram executadas numerosas peças que também não o eram. Adiantam que o motivo pudesse ser político: “na arte como na política, os países pequenos nem sempre estão numa posição muito favorável perante os grandes”.[27] Até 1952, porém, Sonata continuou a receber comunicações da SIMC, pelo que, em Março desse ano, Lopes-Graça voltou a solicitar a baixa da sociedade. Nessa carta, explicava que tinha tentado criar uma secção portuguesa, à margem da Sonata:
Tentei porém organizar uma outra Secção para a substituir, uma Secção que teria mais oportunidades de dar resposta às obrigações estatutárias, reunindo em torno de uma personalidade relevante e oficialmente bem considerada ou de um organismo musical ou cultural oficial todos os compositores portugueses, em particular, aqueles que, por motivos que não pretendo sublinhar, sempre se mostraram relutantes no que se refere à Sonata. Devo admitir que, infelizmente, os meus esforços não tiveram por enquanto nenhum sucesso e que não tenho esperança de poder fazer alguma coisa neste capítulo.[28]
Quais eram os compositores então activos em Portugal? O arquivo da Sonata dá pistas para dar resposta a esta pergunta. Num relatório solicitado pelo Centro de Documentação das Artes e das Letras da UNESCO em 1949,[29] encontramos inscritos os seguintes nomes de compositores “vivos”: Francine Benoit, Joly Braga Santos, Cláudio Carneyro, Rui Coelho, Jorge Croner de Vasconcelos, Armando José Fernandes, Frederico de Freitas, Luís de Freitas Branco e Fernando Lopes-Graça. São nove nomes ao total, um número a todas luzes insuficiente para poder ter justificado uma maior visibilidade na programação internacional. Em 1951, como podemos comprovar na Tabela 4, este número era ainda menor.
É evidente que o reduzido número de compositores activos em Portugal era insuficiente para impor a presença do país na SIMC. Foi preciso esperar até 1976 para que a obra de um compositor português –Voix, de Jorge Peixinho– fosse programada pela primeira vez num dos seus festivais (Haefeli 1982, 588). Ao contrario, um total de 67 compositores programados na Sonata foram ouvidos, pelo menos uma vez, nos festivais da SIMC (dados extraídos a partir de Haefeli 1982, 547-609), o que perfaz o 54% do total. Tomando em consideração que foram programados treze autores portugueses, ou seja, cerca do 10% do total, nenhum dos quais foi programado na SIMC, o peso da influência desta sociedade não pode ser ignorada, mesmo quando não se estabelecesse uma relação de causa efeito: isto é, são raros os compositores da SIMC programados em Lisboa em datas próximas aos seus concertos nos festivais.
Já era conhecido o contraste existente entre a opinião que Lopes-Graça tinha acerca da transcendência da Sonata, concebida por ele como uma “missão histórica”, e a realidade das circunstâncias de carácter produtivo que condicionaram a sua atividade durante cerca de duas décadas. Não se conhecia porém em detalhe a estimável tarefa que desenvolveu em termos de programação e de internacionalização, em particular, durante a sua passagem pela Sociedade Internacional pela Música Contemporânea, que não tinha sido analisada até agora. O tema não foi, porém, esgotado. Há, sobretudo, três questões que ficaram fora dos limites deste artigo, mas para as quais é um ponto de partida. A dimensão da Sonata só poderá ser apreendida inteiramente tomando em consideração os intérpretes que nela participaram, assim como as restantes organizações musicais privadas que também funcionaram em Lisboa durante as décadas de 40 e de 50. Só um trabalho ulterior, e para o qual será preciso localizar documentação diferente da usada neste trabalho, poderá estudar as redes através das quais chegaram ao arquivo da sociedade as partituras que foram interpretadas, a predominância de determinadas editoras ou tudo o que teve a ver com a eventual gestão dos direitos de autor. Fica, em terceiro lugar, por confirmar em estudos futuros até que ponto o trabalho de programador desenvolvido por Lopes-Graça influenciou o seu percurso como compositor e, ao contrário, um problema sobre o qual este artigo não se tem debruçado é o da função que as obras programadas tiveram na consolidação pública das propostas criativas oferecidas pelo compositor.
A programação da sociedade Sonata respondeu a linhas bem definidas, das quais Lopes-Graça foi por inteiro o responsável e que obedeceram, como foi apontado, ao propósito de modernizar as práticas musicais lisboetas e de internacionalizar os compositores portugueses e de mostrar, em Portugal, o que se fazia internacionalmente do ponto de vista da música erudita. O evidente, e foi sublinhado pela critica, é que os objectivos divulgadores acabaram por se sobrepor a outro tipo de considerações de carácter artístico. E que, finalmente, apesar do esforço, a sociedade não contribuiu para a difusão da música de autoria de compositores portugueses fora da fronteira do país. Os seus protagonistas demostraram ter alguma razão quanto à sua constatação da impossibilidade das personalidades artísticas compensarem o peso das nações musicais com maior massa crítica, onde operavam poderosas instituições musicais e que tinham conseguido atingir um volume de produção notavelmente maior do que o português. Ainda, só um trabalho comparativo futuro, que tome em consideração o que foi programado pela SIMC nos anos durante os quais Sonata fez parte dela, poderia ajudar a entender os motivos de carácter estético que, eventualmente, também poderiam explicar a ausência da música portuguesa nos seus festivais.
Sonata provocou ainda um certo debate crítico e um movimento, porém, certamente inferior em densidade e qualidade àquele que Lopes-Graça pretendia suscitar. A tendência da crítica à Sonata permanecer dentro do âmbito dos críticos que apoiavam os princípios da iniciativa e que não consideravam de forma negativa o seu carácter divulgativo e, em certa medida, amador do ponto de vista produtivo, produziu certamente o efeito de uma relação de analogia que dificilmente podia transfomar a realidade musical portuguesa e que provavelente apenas dialogava com os iniciados, eles próprios suscritores da Sonata. A imprensa, de resto, respondeu como se esperava, assinalando os eventos de interesse jornalístico, a começar pelo acontecimento que suponha a própria inauguração das actividades da organização.
Essas linhas de acção baseadas no objectivo de reforçar o desejável “modernismo” e “internacionalismo” da vida musical lisboeta foram desenvolvidas com uma constância próxima da obstinação, mesmo quando já se tinha tornado evidente que o sucesso atingido estava longe do desejado. Ainda, a independência perante o Estado, o mercado e as imposições partidárias foi uma constante, cujo sucesso está inscrito no mero facto de ter sobrevivido ao longo de duas décadas em condições precárias e num período histórico particularmente conturbado, durante o qual sobreviver à margem de um Estado dictatorial era, na realidade, uma forma de heroísmo quotidiano. Esta independência caracterizou-se, finalmente pela criação e defesa de uma esfera do musical onde a liberdade artística foi um desejo constante e a variedade e a apertura, a norma. Que estas aspirações acabassem condicionadas pelas limitações do campo em que se inscreveram não lhe retira o mérito.
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Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de João José Cochofel para Fernando Lopes-Graça, Coimbra, 22-11-1945.
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Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Luís de Freitas Branco para Fernando Lopes-Graça, Reguengos de Monzaraz, 14-12-1946.
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Biblioteca Nacional de Portugal, Lisboa, Espólio 23, Documento 1719, carta de Fernando Lopes-Graça a João José Cochofel, Lisboa, 18-3-1943.
Repertório programado nos concertos da Sonata em Lisboa
1. Nome do compositor
2. País de origen
3. Datas de nascimento e morte
4. Título (o asterisco indica ter sido uma primeira audição portuguesa)
5. Data de composição
6. Data de apresentação
7. Número do concerto
[1] “Designing a concert program necessarily involves a set of compromises among publics, musicians, tastes, and, by extension, social forces. Because most concerts serve a variety of groups with different tastes, desires, and needs, planning a program is a kind of political process”. A tradução é da autora.
[2] A documentação relativa à programação da Sonata conserva-se em duas pastas guardadas no arquivo da AAM, pelo que, salvo se for indicado o contrário, as fontes arquivísticas citadas no artigo provêm desse fundo. Agradeço à Academia de Amadores de Música, na pessoa da responsável do seu arquivo, Leonor Lains, as facilidades que me ofereceram para trabalhar nele. Agradeço também a Rui Magno Pinto a sua ajuda.
[3] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Sonata, Programas e críticas, 1942/6-1-948, programa de concerto, 28-12-1942, [Fol. 4].
[4] Uma segunda carta sobre o mesmo tema (Lopes-Graça [1945b] 1979), enviada ao director do mesmo diário, não foi publicada, presumivelmente por indicação da polícia política, como podemos deduzir da existência de uma cópia da mesma no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lisboa, Arquivo PIDE/DGS, Proc. n° 2585-SR.
[5] Porém, nesta época, o que seria o embrião do Coro da AAM sim foi vinculado por Lopes-Graça com a actuação manifestamente política (Cascudo 2014).
[6] Arquivo pessoal de Arquimedes da Silva Santos, consultado em Vila Franca de Xira, na sua presença (8-7-1997), carta de Fernando Lopes-Graça a Arquimedes da Silva Santos, 20-12-1944.
[7] Lopes-Graça escreveu a Elegia a Herculana Alves de Carvalho, mãe de Luisa e de Guilherme, após o seu falecimento. A obra foi estreada no concerto 68°, a 22 de Junho de 1953. Herculana, por causa da prisão e posterior desterro do filho por motivos políticos em 1948, distinguiu-se pelo apoio que prestou aos presos do Estado Novo que, tal como o seu filho, militante comunista, tinham sido desterrados ao penal do Tarrafal, na Ilha de Santiago em Cabo Verde (Serralheiro 2005). Fernando do Valle, médico, foi um dos fundadores do Partido Socialista. Arquimedes da Silva Santos, também médico de formação, tal como Cochofel e Lopes-Graça, para além de apoiar o Movimento de Unidade Democrática, militava no Partido Comunista. Sobre o MUD e a sua ligação com o PCP veja-se Madeira 1996 e Vilaça 1998.
[8] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de João José Cochofel para Fernando Lopes-Graça, Coimbra, 22-11-1945.
[9] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Arquimedes da Silva Santos para Fernando Lopes-Graça. [s.l., s.d.].
[10] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de João José Cochofel para Fernando Lopes-Graça, Coimbra, 29-1-1946.
[11] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Luís de Freitas Branco para Fernando Lopes-Graça, Reguengos de Monzaraz, 14-12-1946.
[12] Longe de ser um lugar comun, e dada a militância comunista do compositor, parece evidente que esta reivindicação deve ser lida no contexto específico da recepção do marxismo em Portugal nos anos 30 e 40 (veja-se, em relação com um projecto contemporâneo, Cascudo 2014).
[13] Lopes-Graça distanciou-se em privado das teses expostas neste artigo que, aliás, tinha sido ele próprio a solicitar, veja-se Biblioteca Nacional de Portugal, Lisboa, Espólio 23, Documento 1719, carta de Fernando Lopes-Graça a João José Cochofel, Lisboa, 18-3-1943.
[14] 345 foram executadas uma única vez, 39, em duas ocasiões e oito, em três ocasiões, o que perfaz um total de 392 títulos diferentes, dos quais, perto do 40% em primeira audição portuguesa.
[15] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, cópia da carta de Fernando Lopes-Graça para o presidente da SIMC, Lisboa, 25-1-1946.
[16] “Institution qui, sous mon orientation et hors de tout but commercial, se consacre à Lisbonne à donner des concerts exclusivement composés d’oeuvres de musique contemporaine”. A tradução é da autora. Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, cópia da carta de Fernando Lopes-Graça para o secretário da SIMC, Lisboa, 15-4-1946.
[17] A carta de Freitas Branco, antes citada, era uma resposta à circular.
[18] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, circular de 13-12-1947.
[19] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Godofredo Petrassi a Fernando Lopes-Graça, Roma, 10 -10-1947.
[20] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de H. J. Koellreutter para Fernando Lopes-Graça, Rio de Janeiro, 28-11-1947.
[21] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Óscar Esplá para Fernando Lopes-Graça, Heide-Kalmthout, 2-12-1947. Provavelmente, a execução da peça de Rodolfo Halffter antes comentada foi uma consequência deste contacto.
[22] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta do Secretário do Sindicato dos Compositores Checos para Fernando Lopes-Graça, Praga, 22-12-1948.
[23] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Fernando Lopes-Graça para Artur Malawski, Lisboa, 4-8-1949.
[24] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Herbert Hübner para Fernando Lopes-Graça, Hamburgo, 9-12-1952.
[25] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de T. Khrenikov e A. Khachaturian para a Direção da Sonata, Moscovo, 23-9-1958.
[26] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, copia da carta enviada por Luís de Freitas Branco e Fernando Lopes-Graça para o presidente da SIMC, Lisboa, 12-5-1950.
[27] “Dans l’art comme dans la politique, les petits pays ne sont pas toujours dans une position très favorable vis à vis les grands”. A tradução é da autora.
[28] “J’ai essayé pourtant d’organiser une autre Section pour la remplacer, une Section qu’aurait plus de chances de remplir les obligations statutaires, en assemblant autour d’une personalité marquante et officiellement considérée ou bien autour d’un organisme musical ou cultural officiel, tous les compositeurs portugais, en particulier, ceux qui, pour des raisons qu’il n’entre pas dans mes intentions de souligner, se sont montrés toujours réticents envers Sonata. Je dois avouer que, malheureusement, mes efforts n’ont pas été couronnés jusqu’à ce moment d’aucun succès et que je n’espère pas venir à bout de quelque chose dans ce chapitre”. A tradução é da autora. Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, copia da carta de Fernando Lopes-Graça para Edward Clark (SIMC), Lisboa, 30-3-1952.
[29] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, carta de Gaston Dufy para Fernando Lopes-Graça, Sèvres, 19-11-1949.
[30] Academia de Amadores de Música, Lisboa, Arquivador Sonata. Correspondência de 1943 a 1961, copia da carta de Fernando Lopes-Graça para Gordon Menzies (UNESCO), [s.l., s.d., Janeiro de 1951].
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